cinco músicas que eu gostaria de ter postado como indireta no msn
uma seleção retroativa
Muita coisa que o MSN inventou não existe mais. O botão que puxa o teu chat pra frente da tela do amigo, tampando o que quer que ele esteja fazendo em vez de te dar atenção. O plugin que faz seu nome aparecer colorido — a menos que a outra pessoa não tenha o plugin instalado, e aí ela só vê um monte de colchete. O wink que é o desenho de um homem abaixando a calça e peidando em tela cheia. Ficou tudo em 2009.
Com a padronização da internet, essas funções mais excêntricas deram lugar a um repertório comum; o feijão com arroz dos apps. E nessa experiência online homogênea o pouco do MSN que sobrevive perdeu sua especificidade: ninguém nem lembra que foi por lá que a figurinha nasceu.
Se umas funções do Messenger sumiram por ninguém imitar e outras por serem imitadas demais, a contribuição definitiva do MSN pra nossa cultura só pode ser ele: o verso-como-indireta.
Isso porque as próprias condições de existência do verso-como-indireta se perderam. Pensa comigo: a tela inicial do MSN era a lista completa, em ordem alfabética, dos contatos online. Você tinha seu espaço demarcado na lista — uma altura curtinha e a largura inteira do monitor. Ninguém aparecia duas vezes. Cada um no seu lugar, com a fatia de atenção que lhe cabe.
Essa escolha de design, impossível de ser reproduzida num celular, incentiva longas divagações públicas. Raramente você via um combo de nome e status com menos de 100 caracteres. O resultado era uma lista de contatos transformada em ágora — cada um gritando seu assunto.
Nenhum app que prioriza o que é mais recente, ou o que mais te interessa, oferece essa visão panorâmica. Logar no MSN de manhã era quase uma revista militar: você ia descendo as fileiras e descobrindo quem virou corna, quem quer se matar, quem torce pro Vasco, tudo só de bater o olho. E a essência da indireta é justamente essa mensagem pulverizada, um desabafo que quer sair de você sem chegar em ninguém. Se eu tenho que abrir um story pra saber que você tá com raiva, a coisa já deu errado.
Mas uma indireta tão pública corre o risco de ser apenas direta. Às vezes a mensagem pede uma falha de comunicação mais caprichada. Daí que entra o verso — enquanto a indireta normal tá satisfeita em confundir o destinatário, que não sabe se o papo é com ele, a indireta em verso não expõe nem o remetente. É tudo terceirizado, todo mundo gozando com o pau do outro. Não fui eu que falei, foi a Marisa Monte… a doida é ela!
Nesse espírito de nostalgia por tempos mais complexos, passei o dia pensando em músicas que eu gostaria de ter postado como indireta no MSN.
BILLIE EILISH - L’AMOUR DE MA VIE
Depois de tanto maldizer a pobre da Billie, que só aqui no blog eu já chamei de “songamonga” e “Marquito”, talvez surpreenda o leitor descobrir que eu adoro HIT ME HARD AND SOFT (2024).
Não devia. Se tem uma coisa que eu não prezo é a minha própria opinião. Em HMHAS, Billie revela ser a grande compositora que eu sempre desconfiei que ela fosse — capaz de produzir um álbum tão patético, tão carente e coitado que só pode ser arte.
Qualquer faixa renderia um bom status de MSN, mas L’AMOUR DE MA VIE captura bem aquela frieza afoita do adolescente; a pressa de rejeitar antes de ser rejeitado. Melhor ainda quando o revisionismo histórico da letra (But I need to confess/ I told you a lie/ When I said you/ Were the love of my life) é imediatamente desfeito em BITTERSUITE. Carimba que é artista!
MITSKI - LONESOME LOVE
Falando em patética, o acervo da Mitski é um tesouro de frases pro MSN. I know that I ended it, but/ Why won’t you chase after me? (de Why Didn’t You Stop Me?) parece algo que eu escreveria depois de terminar com o namorado que botou como foto de perfil no Orkut uma lua estampada com o brasão do Flamengo.
Lonesome Love, do mesmo álbum (Be The Cowboy, 2018), é uma admissão de derrota. I call you, to see you again/ So I can win, and this can finally end — o charme da letra é esse tom de franqueza autoconsciente que você usaria com seu psicólogo. No fim das contas, a frustração da Mitski é com ela mesma. Nem ela entende essa vontade de obter dos outros permissão pra gostar de si. O caso é clínico; bota uma fotinha do All Star pra jogo e tá pronto!
CHARLI XCX - TALK TALK
brat (2024) é o álbum do ano, o que não vem ao caso. Enquanto eu terminava essa lista, a
postou um texto sobre brat que eu ainda não li mas certamente é melhor do que qualquer coisa que eu possa escrever sobre o assunto.Me interessa mais o potencial fortíssimo de Talk Talk como indireta, que eu com certeza teria explorado em 2009 se a Charli não estivesse terminando o ensino médio. I wish you'd talk, talk/ Wish you'd talk, talk/ Wish you'd talk, talk/ Wish you'd just talk to me. E repete: I wish you'd talk, talk/ Wish you'd talk, talk/ Wish you'd talk, talk/ Wish you'd just talk to me.
Perfeito. É exatamente assim o monólogo interno da saudade. Chega uma hora que você cansa de elaborar os porquês e os prós e contras e se rende à circularidade do desejo — sim, eu gostaria de estar falando contigo. Sim!, eu gostaria de estar falando contigo. Fazer o quê.
MARIAH CAREY - FANTASY
Eu adoro a ideia da Mariah de 95 — uma das mulheres mais lindas do mundo — ter gravado uma música sobre desejar alguém em segredo. Toda gostosa e tá lá enfurnada no quarto sonhando acordada. Como ela é humilde, meu Deus…. como ela é povão…. Mariah is soooo kind :)
Fantasy não é exatamente uma música triste; parece mais que ela tá levando o ridículo da coisa na esportiva. Chegou no estúdio falando Gente, saca só essa palhaçada: Images of rapture/ Creep into me slowly/ As you go into my heEeEead… É mole? Cada uma!!
SNAIL MAIL - PRISTINE
Se Fantasy já é meio brincalhona, Pristine é uma grande piada. And I know myself and I'll never love anyone else/ I won't love anyone else/ I'll never love anyone else!
Tu sabe sim que vai gostar de mil pessoas, mas é gostoso se levar pelo exagero. Às vezes a vida precisa de um temperinho, um envolvimento, um melodrama. Querer alguém que não te quer é melhor do que não querer nada. Tá meio parado seu dia? Inventa um grande amor!
Speaking Terms, a faixa seguinte, é um banho de água fria. Leave things on speaking terms/ And I’ll see you around — e a eternidade que se foda!
FAIXA BÔNUS: THE SMASHING PUMPKINS - PERFECT
Cinco é um número mais agradável que seis, então Perfect entra de faixa bônus, varrida pra baixo do tapete.
Faz sentido. Quinze anos atrás eu teria usado qualquer verso em que o eu lírico estivesse convencido da permanência das coisas. Tudo parecia infinito; os fatos são o que são, e continuam sendo. Em vez de desapaixonar com calma eu ia emendando um amor no outro, tudo embolado numa agonia só. Saía procurando o anterior no próximo e ia guardando um pedaço de cada um, como se eu mesma fosse um frankenstein dos meus amores.
Nesse contexto, Perfect não faria sentido. You'll see, I promise we'll be/ Perfect/ Perfect strangers when we meet/ Strangers on the street/ Lovers while we sleep são as palavras de alguém que se resignou ao fim, e até encontrou algum alívio nisso. Chegando agora nos 30, eu entendo melhor o que é se fartar de um ciclo. Já deu? Já deu. Próximo!
Diretamente da comunidade do orkut Eu Amo a Laurinha Leroh °{Oficial}, numa playlist só:
https://open.spotify.com/playlist/798bvtusziad4dgllvwxU1?si=PlTV5iJkR4eg7M7QuhXhbA&pi=Le_jeayrS_qXz
Agora a gente viu metade do seu rosto a mais de 10 anos atrás. O mistério morreu